Hoje, pela manhã, a saída para a escola foi difícil. Sempre é. Valentina demora a levantar, depois curte um banho longo e, pra completar, pensa bastante antes de escolher a roupa da escola. Detalhe: a escola exige farda. Especialmente hoje, entretanto, ela já acordou sendo grosseira com o pai, chorou e brigou com ele, não necessariamente nessa ordem. Depois de eu ter colocado muita psicologia em prática, ela foi pedir desculpa:
– Desculpa, papai, eu não faço mais.
Conflito resolvido. Podemos agora agilizar a saída? Afinal, preciso trabalhar (pensei, eu, com meus botões). Mas, como o recurso da palavra mágica tem que ser repensado, ela completou:
– Eu já pedi, mas não vou mais ficar preocupada quando ele estiver fora de casa e demorar a chegar.
Segundos de surpresa da minha parte. Mas, o pai não achou pouco que ela tenha me surpreendido. Ele próprio, Marcelo, meu digníssimo companheiro, resolveu fechar com chave de ouro. Embora criados como católicos, nós não praticamos o catolicismo (apesar de nossos filhos serem batizados, claro). Nunca levamos as crianças à igreja (a não ser no dia dos batismos) e me considero agnóstica (uma teísta agnóstica, diga-se de passagem). Entretanto, momentaneamente convicto (aliás, convicção é o que não falta neste país, recentemente) de que estamos educando errado, Marcelo disparou:
– Isso é porque não vai à igreja, não tem religião, não aprendeu a honrar pai e mãe… Não aprendeu os 7 mandamentos…
Parou, pensou.
A essa altura, eu já me retirava discretamente do recinto, sem me conter e querendo evitar que Valentina me visse rindo…
– Ah, os 10 mandamentos…
Completou. Dessa vez, sem muita convicção…